A cana-de-açúcar é uma cultura essencial para o Brasil, desempenhando um papel vital na economia como a principal fonte de produção de açúcar e etanol, além de gerar milhões de empregos e contribuir significativamente para a matriz energética do país.

Contudo, a cultura enfrenta diversos desafios, entre eles, a ameaça constante de doenças que podem comprometer seriamente sua produtividade. Conhecer as principais doenças que afetam a cana-de-açúcar, as formas de contaminação e as medidas de controle é fundamental para assegurar colheitas saudáveis e economicamente viáveis. 

Neste texto, vamos abordar as principais doenças que atingem essa cultura, além de discutir estratégias eficazes de manejo, com foco no Manejo Integrado de Doenças (MID).

Por que controlar as doenças no canavial?

O controle eficiente das doenças no canavial é crucial para manter a produtividade e a sustentabilidade da cultura de cana-de-açúcar. 

Quando não gerenciadas adequadamente, essas doenças podem causar uma série de danos às plantas, resultando em perdas significativas na produção e impactando diretamente a rentabilidade do produtor.

Principais danos causados pelas doenças

As doenças na cana-de-açúcar afetam diferentes partes da planta, como folhas, colmos e raízes, comprometendo funções vitais, por exemplo, a fotossíntese e o acúmulo de sacarose. 

Entre os danos mais frequentes, destacam-se a redução do crescimento das plantas, o apodrecimento dos colmos, a morte prematura de brotos e a desfolha, que afetam negativamente o rendimento e a qualidade da produção.

Prejuízos econômicos

Os prejuízos econômicos decorrentes da falta de controle de doenças podem ser devastadores. Em casos severos, a produção pode cair drasticamente nas áreas altamente infectadas. 

Além de diminuir a quantidade de sacarose, que impacta diretamente na produção de açúcar e etanol, o canavial doente tem uma vida útil reduzida, exigindo replantios mais frequentes. Essa queda na eficiência produtiva reduz a lucratividade dos produtores e pode impactar negativamente toda a cadeia de abastecimento, desde a indústria até o comércio, gerando perdas financeiras substanciais.

Portanto, o investimento em estratégias de controle, como o Manejo Integrado de Doenças, é essencial para evitar esses prejuízos e garantir a rentabilidade sustentável do canavial ao longo das safras.

A seguir, falaremos sobre as principais doenças que atacam os canaviais, suas características e sintomas.

Carvão-da-cana-de-açúcar

O carvão-da-cana-de-açúcar é uma das doenças mais preocupantes da cultura. Causada pelo fungo Sporisorium scitamineum, essa doença é particularmente devastadora porque afeta o crescimento e o desenvolvimento da planta, resultando em perdas significativas de produtividade.

O principal sintoma do carvão é a formação de um “chicote” nas hastes, que se apresenta como uma estrutura cilíndrica e alongada, de coloração escura, contendo milhões de esporos do fungo

As plantas infectadas apresentam também superbrotamento, afinamento dos colmos e desenvolvimento de gemas laterais, sintomas que comprometem a qualidade e o rendimento da cana. A doença ataca principalmente a gema apical, local onde o fungo se aloja e começa a se desenvolver.

A disseminação do carvão ocorre, principalmente, por mudas infectadas, que carregam o fungo de uma safra para outra. Os esporos do fungo também podem ser transportados pelo vento e pela água, contaminando plantas próximas. 

Outro fator que favorece a propagação é o uso de ferramentas de corte infectadas, como facões e colhedoras, que podem espalhar o patógeno entre as áreas de plantio.

Mosaico-da-cana-de-açúcar 

O agente causador do mosaico-da-cana-de-açúcar é o vírus Sugarcane Mosaic Virus – SCMV, que possui, até o momento, 14 linhagens distintas, classificadas de A a N. No Brasil, a linhagem B é a mais comum e prevalente nos canaviais. 

A severidade da infecção, os sintomas observados e as perdas de produtividade variam conforme a linhagem do vírus, tornando o controle da doença um desafio constante para os produtores de cana-de-açúcar.

Os sintomas do mosaico aparecem principalmente nas folhas, onde áreas de diferentes tons de verde contrastam entre si. Geralmente, essas áreas variam entre um verde muito intenso e regiões mais claras ou cloróticas, sendo mais visíveis na base e nas lâminas foliares. 

Em estágios avançados, a doença pode causar avermelhamento e até necrose das folhas. 

A transmissão do vírus ocorre, principalmente, por meio de pulgões de diferentes espécies, que agem como vetores ao se alimentarem da planta. 

Além disso, o uso de mudas infectadas, seja para viveiros ou canaviais comerciais, é uma forma importante de disseminação do mosaico.

Escaldadura das folhas 

É causada pela bactéria Xanthomonas albilineans, que coloniza os vasos da planta e se espalha sistematicamente pelos tecidos vegetais. A doença manifesta-se de maneira variada, dependendo das condições locais, com sintomas que podem ser mais ou menos severos conforme o ambiente. 

Essa variação torna o diagnóstico mais difícil e exige atenção especial dos produtores em diferentes regiões.

Com grande potencial destrutivo, especialmente em variedades suscetíveis, a escaldadura das folhas pode causar prejuízos significativos. No Brasil, a doença, muitas vezes, é subestimada devido à confusão de seus sintomas com o raquitismo da soqueira. 

Entretanto, em variedades extremamente suscetíveis, pode resultar em perda total, provocando deformações nos colmos, morte das touceiras e redução tanto na produção quanto na concentração de sacarose. 

A doença apresenta três principais de sintomas: 

  • descoloração nos nós dos colmos
  • estrias brancas nas folhas e, 
  • a queima total das folhas (em casos mais graves).

A disseminação da escaldadura ocorre de diversas formas. A bactéria entra nos colmos por meio de ferimentos e permanece na planta por toda sua vida, sendo espalhada durante a colheita por ferramentas contaminadas. 

Ventos e chuvas também ajudam a espalhar a bactéria por longas distâncias, principalmente em condições de estresse, como frio intenso, seca ou calor excessivo, que podem desencadear a fase aguda da doença. 

Ferrugem-marrom da cana

A ferrugem-marrom, causada pelo fungo Puccinia melanocephala, é uma das doenças fúngicas mais comuns e economicamente significativas da cana-de-açúcar. A doença é favorecida por condições climáticas quentes e úmidas, o que a torna especialmente prevalente em áreas tropicais.

Os sintomas da ferrugem-marrom incluem o aparecimento de pequenas pontuações cloróticas que evoluem para lesões alongadas amareladas. Com o avanço da doença, as manchas se tornam marrons e podem aumentar de tamanho e coalescer, formando áreas necróticas maiores. Observa-se também a formação de pústulas na face inferior da folha

Essas lesões reduzem a capacidade fotossintética da planta, levando a uma redução no crescimento e no acúmulo de açúcares nos colmos.

A ferrugem-marrom é disseminada por esporos do fungo, transportados pelo vento e pela água. Plantas infectadas atuam como fontes de inóculo, e a doença se espalha rapidamente em condições favoráveis de temperatura e umidade.

Estria vermelha

A estria vermelha é uma doença bacteriana causada pela Acidovorax avenae subsp. avenae, que pode causar perdas consideráveis em situações de surtos severos.

Os sintomas da estria vermelha aparecem como listras finas nas folhas, inicialmente encharcadas, que evoluem para uma coloração avermelhada, sempre paralelas à nervura central. 

Essas listras podem se estender até alcançar a região do meristema apical, levando à morte dos tecidos, sintoma conhecido como podridão do topo.

A bactéria é transmitida principalmente por mudas infectadas, mas também pode ser disseminada por respingos de água e ferramentas contaminadas. Ambientes com alta umidade e temperaturas elevadas favorecem o desenvolvimento e a disseminação da doença e coincidem com o período de maior desenvolvimento da cana.

Além dessas doenças, diversos outro patógenos podem interferir na produtividade e na rentabilidade do canavial:

  • ferrugem-alaranjada (Pulccinia kuehnii);
  • raquitismo da soqueira (Leifsonia xyli subsp. xyli);
  • podridão abacaxi (Thielaviopsis paradoxa);
  • amarelinho (Sugarcane yellow leaf virus – ScYLV);
  • mancha-de-curvulária (Curvularia inaequalis);
  • mancha-parda (Cercospora longipes);
  • mancha-anelar (Leptosphaeria sacchari);
  • podridão vermelha (Colletotricum falcatum).

Para evitar que essas doenças se espalhem pela lavoura e comprometam a lucratividade, o produtor deve priorizar os princípios do Manejo Integrado de Doenças.

Manejo Integrado de Doenças (MID) na cultura da cana-de-açúcar

O MID na cultura da cana-de-açúcar é uma ferramenta estratégica que visa o controle eficiente de patógenos ao combinar diferentes práticas e tecnologias. 

Ao unir o monitoramento constante do canavial com técnicas de controle cultural, biológico e químico, o MID garante uma gestão equilibrada das doenças, promovendo plantas mais saudáveis e produtivas. 

Essa integração de métodos é fundamental para minimizar os danos causados por doenças e garantir a sustentabilidade da lavoura ao longo do tempo.

Vantagens do MID

A principal vantagem do MID é a capacidade de proporcionar um controle mais eficiente e sustentável dos patógenos. Dessa forma, o MID fortalece a resistência da plantação e reduz os riscos de surtos epidêmicos. 

Além disso, promove o uso racional de tecnologias, valoriza o ambiente agrícola e melhora a longevidade e a produtividade do canavial. O resultado é uma lavoura mais saudável, com maior capacidade de resposta a doenças e melhor rendimento ao longo das safras.

Monitoramento: a base para um manejo eficiente

O monitoramento é a fase inicial e crucial do MID. Ele envolve a observação constante do canavial para identificar precocemente os primeiros sinais de doenças. 

O monitoramento regular permite que o produtor tome decisões informadas sobre o melhor momento para agir, evitando que os patógenos se propaguem e causem danos mais graves. Essa prática inclui a inspeção visual das plantas e, quando necessário, a coleta de amostras para análise em laboratório. 

O acompanhamento contínuo da saúde do canavial é essencial para que o manejo das doenças seja preciso e oportuno.

Controle cultural: prevenção e fortalecimento da cultura

O controle cultural envolve práticas agrícolas que reduzem a incidência de patógenos no ambiente de produção. 

Algumas dessas práticas incluem o uso de mudas certificadas e saudáveis e, quando aplicável, a rotação de culturas para quebrar o ciclo dos patógenos no solo. 

Além disso, o manejo adequado da irrigação e a escolha de espaçamentos corretos entre as plantas são práticas que ajudam a evitar condições favoráveis ao desenvolvimento de fungos e bactérias. O controle cultural é uma ferramenta preventiva eficaz, que contribui para a sanidade geral do cultivo.

Controle biológico: utilização de inimigos naturais

O controle biológico utiliza organismos benéficos para combater os patógenos da cana-de-açúcar de forma natural. Isso inclui a introdução de agentes, como fungos, bactérias e insetos, que atuam como antagonistas dos patógenos, inibindo seu desenvolvimento. 

A implementação de produtos biológicos, compostos por microrganismos benéficos, tem se mostrado eficaz no controle de doenças. Esse método valoriza o equilíbrio ecológico do canavial, permitindo que os inimigos naturais atuem de maneira integrada ao sistema agrícola.

Controle químico: foco no controle preventivo e no uso criterioso

O controle químico é uma ferramenta essencial dentro do MID, mas seu uso deve ser priorizado de forma preventiva, ou seja, antes que as doenças atinjam níveis críticos. 

O objetivo do controle químico preventivo é impedir que os patógenos se estabeleçam ou se disseminem pelo canavial, garantindo que a cultura permaneça saudável ao longo de todo o ciclo produtivo. Isso inclui o uso de fungicidas e bactericidas registrados para a cana-de-açúcar, aplicados conforme o monitoramento da lavoura.

Para que o controle químico seja eficaz, é fundamental que o produtor siga as recomendações técnicas, incluindo a rotação de moléculas para evitar a seleção de patógenos resistentes. 

Além disso, o uso de doses adequadas e o respeito aos intervalos de aplicação são medidas essenciais para maximizar a eficiência dos produtos. 

Quando aplicado de forma preventiva e integrada com os controles cultural e biológico, o controle químico atua como uma barreira adicional para proteger a cultura e assegurar que as doenças não comprometam a produtividade do canavial.

Caminhos para um controle eficiente das doenças na cana-de-açúcar

As doenças que afetam a cultura da cana-de-açúcar representam um desafio significativo para a produtividade e a saúde dos canaviais no Brasil. 

Patógenos, como o vírus do mosaico, a ferrugem-marrom, a escaldadura das folhas e outros, podem causar grandes prejuízos econômicos, comprometendo a qualidade e o rendimento da colheita. 

A compreensão profunda dessas doenças, aliada a estratégias eficientes de controle, é fundamental para garantir a sustentabilidade da produção de cana-de-açúcar no longo prazo.

O MID surge como a estratégia mais eficaz para lidar com esses desafios, ao combinar métodos de monitoramento, controle cultural, biológico e químico de forma complementar. Ao adotar essa ferramenta, os produtores não apenas maximizam o controle das doenças, mas também promovem a longevidade e a saúde do canavial, garantindo colheitas mais robustas e produtivas. 

Dessa forma, o MID contribui para uma agricultura mais eficiente, sustentável e preparada para enfrentar os desafios impostos pelos patógenos que afetam a cana-de-açúcar.